segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

As prensas do Garatuja.

Márcio Zago

Prensa construída por Romildo Paiva e Joaquim Gimenes Salas
na década de sessenta.






















A gravura brasileira viveu um momento de florescimento e expansão nos anos sessenta. O Ateliê Livre de Gravura do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e outros espaços espalhados pelo país voltados à produção, ensino e reflexão da linguagem contribuíram para isso. Em Atibaia esse momento também teve seu reflexo através do trabalho pioneiro de alguns artistas locais. Joaquim Gimenes Salas, Bernardo Antunes e Romildo Paiva foram os responsáveis pela criação do Nugrati – Núcleo de Gravadores de Atibaia, em 1969, por iniciativa de Paulo Mentem. A inspiração vinha do Nugrasp – Núcleo dos Gravadores de São Paulo. Para que as gravuras pudessem ser impressas era necessário ter uma prensa, e na cidade não havia nenhuma até então. A saída foi construí-la. Romildo Paiva, no período em que frequentou o Garatuja, comentou certa vez sobre as dificuldades de obter os materiais, prensa e ferramentas, para a prática da gravura no inicio de sua carreira. Contou que foi necessário improvisar para poder realizar as primeiras matrizes, utilizando até uma prensa adaptada de uma antiga máquina de fazer macarrão. Esse fato é marcante no histórico artístico do Paiva e demonstra claramente sua necessidade orgânica, quase vital, de se expressar especificamente através dessa linguagem, mesmo em condições tão adversas. Esse fato também chamou a atenção de Paulo Mentem, que fez o texto de apresentação de uma mostra que organizou em 1970: “Paiva, e isso é importante para seu ativo, executou gravuras, principalmente a água forte, com prensa improvisada, transformando uma maquina de macarrão em reprodutor de água forte.” A prensa da foto acima foi feita por ele na década de sessenta e contou com a ajuda de Joaquim Gimenes Salas. A intenção era instrumentalizar o Nugrati para a prática da gravura. Não tenho os detalhes, mas provavelmente também foi adaptada de máquinas que tinham outras finalidades. Essa prensa ficou muito tempo no atelier do Gimenes. Foi com ela que realizou toda sua produção artística, no período compreendido entre o fim da década de sessenta até o inicio dos anos oitenta. Em 1984, um ano após seu falecimento, eu comprei a prensa da Maria, sua esposa, assim como várias ferramentas, tintas e apetrechos com a intenção de dar continuidade ao trabalho que ele desenvolvia no Clubinho de Artes e Arteiros de Atibaia. O Clubinho foi à primeira iniciativa de ensino de artes plásticas para crianças em Atibaia, e mais tarde virou o Garatuja. Por vinte anos essa prensa ficou aqui. Em 2004 conheci pessoalmente Romildo Paiva, ao descobrir que estava morando na cidade vizinha de Bragança Paulista. Em pouco tempo nos tornamos grandes amigos e realizamos no Garatuja uma série de atividades como encontros, oficinas e workshops. Na ocasião conheci também outros artistas interessados na gravura, e moradores da região, como o Kraus Von Secca, que construiu comigo uma caixa de breu, utilizada na gravura em metal, e doada posteriormente à entidade. Tempos depois, antes de mudar-se de Bragança, Romildo Paiva também doou ao Garatuja a sua prensa, assim como uma secadora de papel que utilizava profissionalmente (Foto abaixo). Nos últimos anos Romildo havia diminuído o ritmo de trabalho com a gravura tradicional e estava disposto a desfazer-se do material. Essa nova prensa também foi construída por ele e adaptada a suas necessidades, como a rotação mecânica e maior pressão nos cilindros, ideal para a prática da água forte e água tinta, suas especialidades. O atelier do Garatuja não comporta duas prensas. Assim que chegou a prensa doada pelo Paiva, a primeira foi repassada a outro amigo gravurista, agora também morador de Atibaia, o artista plástico Inácio Rodrigues. Inácio assim como Paulo Cheida Sans são artistas que também prestaram, e prestam, grande contribuição a difícil arte da gravura em nosso município.

Prensa construída por Romildo Paiva